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Mostrando postagens de julho, 2021

In Front of Your Face (2021)

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   IN FRONT OF YOUR FACE Direção: Hong Sang-soo Ano: 2021 País de origem: Coreia do Sul     Se existe um cineasta que se consolidou como paixão da cinefilia (especialmente a brasileira) na última década, este foi o coreano Hong Sang-soo. Seus roteiros verborrágicos e estilo de direção bem característico desafiaram a ideia do que é necessário para alcançar complexidade no cinema. Ele retira qualquer aparato que fuja da simplicidade, inclusive a celuloide, assumindo direção, fotografia, roteiro, trilha sonora e produção, e mesmo assim alcança um incrível nível de sofisticação. Outra característica que o tornou tão celebrado foi a sutileza com a qual manipula a estrutura de suas narrativas, além da naturalidade utilizada para saltar entre realidade e sonho. É verdade que seus trabalhos não encantam a todos, mas aqueles que já seguem a carreira dele vão encontrar um dos pontos altos dessa extensa filmografia em In Front of Your Face .       Na história, Sangok (Lee Hyeyoung) volta à Coreia

Women Do Cry (2021)

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  WOMEN DO CRY   Direção: Vesela Kazakova, Mina Mileva   Ano: 2021   Países de origem: Bulgária / França     Numa edição em que a representatividade feminina dentro e fora da tela foi tão discutida em Cannes, além da vitória histórica da Palma de Ouro por Julia Ducournau, Women Do Cry é mais um retrato da opressão à qual corpos femininos são submetidos até hoje. Situada na Bulgária dos dias atuais, uma família constituída majoritariamente por mulheres lida com os preconceitos do patriarcado e com as violências cotidianas. As irmãs Sonja (Maria Bakalova) e Lora (Ralitsa Stoyanova) possuem o maior tempo de tela e são o centro da história, inspirada pelas memórias da codiretora Vesela Kazakova, cujos parentes integram boa parte do elenco. Este é um fato curioso, já que a encenação satírica não aparenta carregar um tom tão pessoal.     Kazakova e Mina Mileva já haviam estreado na direção de longas ficcionais com Cat in the Wall (2019), onde apresentavam a realidade de imigrantes búlgaros

Mes frères, et moi (2021)

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    MES FRÈRES, ET MOI   Direção: Yohan Manca   Ano: 2021 País de origem: França     A Arte é inútil? Para o prefácio do livro O Retrato de Dorian Gray , do escritor Oscar Wilde, ela é sim completamente inútil, assim como muitos pensadores argumentaram ao longo dos séculos. Ela seria um fim em si própria, não trazendo assim qualquer fruto para o sistema, e mesmo assim permanece tão importante. Em Fitzcarraldo , Werner Herzog mostra a personagem de seu protagonista pelas coisas inúteis: mesmo no meio do ano e em completo caos, ele quer pinturas, esculturas, música e boa culinária, algo sem propósito considerando a situação na qual encontra-se. É esta a paixão inexplicável de qualquer amante da cultura, um sentimento que os outros são incapazes de compreender. Como somos tão dependentes de algo que podemos viver sem? A questão é que não podemos.     Da mesma forma, como um garoto de 14 anos, morador de um dos bairros mais pobres do litoral francês, pode explicar para os irmãos mais velho

Streetwise (2021)

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    STREETWISE   Direção: Jiazuo Na   Ano: 2021   País de origem: China     Parte da mostra Un Certain Regard deste ano, Streetwise é a estreia do chinês Jiazuo Na como diretor de longas-metragens. Ele propõe aqui uma jornada concomitantemente introspectiva e energética, bebendo do cinema de crimes e gangsters para discutir sobre algo muito mais pessoal e universal. É difícil descrever com palavras o sentimento humano abordado, mas antes dos créditos finais começarem a rolar, aparece a frase "dedicado a todas as almas em necessidade de conforto". Talvez seja a sensação de estar sozinho, perdido e constantemente angustiado o que o filme quer alcançar em seu estudo de personagem (algo abstrato ao ponto de eu precisar usar o "talvez" no início da frase).     Na sequência inicial, vê-se Dong Zi (Li Jiuxiao) jogar as cinzas de aparentemente um de seus pais no rio enquanto a narração em off fala sobre o que acontece entre o céu e a terra. Assim, o diretor joga o especta

Medusa (2021)

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  MEDUSA   Direção: Anita Rocha da Silveira Ano: 2021 País de origem: Brasil     Enquanto o olhar provocante de uma dançarina penetra o espectador, a câmera gira e coloca o mundo de cabeça para baixo (na verdade, revela que o mundo já está de cabeça para baixo). Esta sequência inicial de Medusa é capaz de revelar muito sobre o que virá pela frente. O corpo expressa, através da dança, toda a esquisitice que permeia o filme, enquanto as luzes neon destacam a identidade visual da diretora e os excessos da própria narrativa, interessada em utilizar o tom satírico e o gênero de horror para fazer sua crítica social.       Mariana (Mari Oliveira) deixou a família no interior para ir atrás de melhores oportunidades na cidade grande, onde integra o grupo de fiéis de uma igreja evangélica neopentecostal. Essas congregações aumentaram exorbitantemente em número durante a última década no Brasil, período que coincide com a ascensão da extrema direita ao poder político do país. Um cenário propício

O Marinheiro das Montanhas (2021)

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  O MARINHEIRO DAS MONTANHAS   Direção: Karim Aïnouz   Ano: 2021   Países de origem: Brasil / França / Alemanha / Argélia     Já nos créditos iniciais, somos apresentados ao significado de "calentura", uma expressão passada de geração para geração entre marinheiros do mundo inteiro, referindo-se à condição na qual eles acordam no meio da noite, tomados por um impulso febril, e avistam belas paisagens floradas onde, na verdade, estão as ondas do mar. Um conceito que ganha novas dimensões dentro da história contada no novo documentário de Karim Aïnouz, o qual explora justamente a ampliação de signos e significados através da relação construída entre sua própria vida e os dois países que lhe deram origem.     No começo de O Marinheiro das Montanhas , a câmera do diretor já está em movimento, e assim permanece durante uma jornada em busca de respostas, seja sobre os pais, o relacionamento deles, política, mas principalmente sobre si. Ele embarca rumo à Argélia, país natal do pai,

Întregalde (2021)

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    ÎNTREGALDE   Direção: Radu Muntean   Ano: 2021   País de origem: Romênia     Política está presente em cada aspecto da vida humana a partir do momento em que esta é inserida em sociedade. Portanto, todo filme é político por natureza, seja uma comédia romântica da Netflix ou uma produção da Marvel e da DC. No entanto, fazer cinema com conteúdo político é diferente, pois questões sobre a forma pela qual o mundo é estruturado são colocadas como centro da história, tornando a tarefa dos realizadores muito mais desafiadora. Mesmo quando a narrativa gira em torno de um personagem, o aspecto macro de sua existência é colocado em constante enfoque. Nesses casos, o cinema recente demonstrou grande cuidado ao tratar de certos temas, fazendo com que os filmes políticos se tornassem fundamentalmente calcados no drama convencional (não que seja negativo em todos os casos, algo que Ken Loach pode provar bem), mas as convenções de gênero já se provaram bastante eficazes para abordar esses tópicos

La Civil (2021)

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  LA CIVIL   Direção: Teodora Mihai   Ano: 2021   País de origem: Bélgica / Romênia / México     A guerra contra as drogas é uma realidade com a qual os brasileiros estão acostumados a conviver, seja diretamente ou nos noticiários. Dia após dia, filhos perdem os pais e pais perdem os filhos numa luta sem fim, que massacra as populações menos favorecidas e parece injustificável diante de tanta violência gerada. No entanto, está longe de ser algo exclusivo do Brasil, e um dos países que mais sofrem com tudo isso é o México, palco de tantas narrativas sobre tráfico que povoaram o imaginário coletivo através de filmes e séries. Na mostra Un Certain Regard deste ano, mais um título desponta como representante desta constante denúncia social que urge do coração da América Latina.     A diretora estreante Teodora Mihai chega em Cannes com uma produção crua, visceral e extremamente aterrorizante. La Civil segue a história (baseada em fatos reais) de Cielo (Arcelia Ramírez), dona de casa cuja

Piccolo Corpo (2021)

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    PICCOLO CORPO   Direção: Laura Samani   Ano: 2021   Países de origem: Itália / França / Eslovênia     Vozes femininas entoam um tradicional canto católico enquanto os créditos iniciais ainda estão sendo exibidos. Nenhuma imagem, mas o som já imerge o público no lirismo que transpassará toda a projeção de Piccolo Corpo , primeiro longa de ficção da diretora Laura Samani. Quando finalmente conseguimos ver de onde aquela música vem, é quase desnorteadora a beleza da composição visual. Um grupo de mulheres caminha na praia e, ao centro, uma delas está coberta por um véu branco que, quando levantado, revela primeiro a gestação da protagonista e depois seu rosto de linhas concomitantemente fortes e graciosas. Com a mão cortada, ela entra no mar como parte de um ritual para lavar os infortúnios e abençoar a gravidez.     Q uando ocorre um corte após esse longo plano, as belas imagens de tons pastéis são contrastadas com a escuridão noturna da cena do parto, fazendo com que a leveza da seq

Clara Sola (2021)

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  CLARA SOLA   Direção: Nathalie Álvarez Mesén Ano: 2021 Países de origem: Suécia / Bélgica / Costa Rica / Alemanha     Filmes com características de coming of age são muito comuns em festivais de cinema, já que possibilitam uma enorme gama de discussões não apenas sobre juventude, mas também sobre tudo que nos molda enquanto indivíduos. Por isso, suas convenções são constantemente utilizadas para debater questões relacionadas a aspectos sociais, políticos e humanos com certa liberdade. E é exatamente isto o que a diretora Nathalie Álvarez Mesén propõe em seu longa-metragem de estreia, selecionado para a Quinzena dos Realizadores 2021. No entanto, há uma diferença considerável entre Clara Sola e outros trabalhos do gênero: sua protagonista é uma mulher de 40 anos.       Já no primeiro plano, somos apresentados à personagem-título (Wendy Chinchilla) tentando alcançar a câmera com a mão, numa composição que assume o ponto de vista de Yuca, uma égua branca que assume o papel de fiel com

The Hill Where Lionesses Roar (2021)

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    THE HILL WHERE LIONESSES ROAR   Direção: Luàna Bajrami Ano: 2021 Países de origem: França / Kosovo     É impossível falar da nova edição do Festival de Cannes sem pensar nos extraordinários sucessos que saíram de lá em 2019. Enquanto Parasita acabou se tornando um dos filmes mais discutidos pela cinefilia nos últimos anos, muitos ficaram com a sensação de que outro título deveria ter recebido a mesma atenção: Retrato de uma Jovem em Chamas , um trabalho que jogou luz sobre a maioria dos profissionais envolvidos, algo que fica bem claro pela seleção deste ano. Enquanto Céline Sciamma está creditada como co-roteirista do novo filme de Jacques Audiard, duas de suas atrizes estreiam na direção de longas-metragens. O filme de Noémie Merlant (também parte do elenco do novo Audiard) terá exibição especial no evento e Luàna Bajrami dirige The Hill Where Lionesses Roar , parte da Quinzena dos Realizadores.     A sequência de abertura exibe as três protagonistas no alto do morro que dá nome

Cannes 2021: nossos 15 filmes mais aguardados

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Arte oficial do 74° Festival de Cannes     Depois de um ano que fez o mundo parar por causa da pandemia da COVID-19, o Festival de Cannes parece estar de volta com o melhor do cinema mundial e com todo o luxo do tradicional tapete vermelho. Após pegar os organizadores de surpresa em 2020, foi necessário cancelar o evento, algo que aconteceu poucas vezes em décadas, embora tenham tomado a decisão de anunciar a seleção oficial, concedendo o selo do festival a grandes filmes ( Les choses qu'on dit, les choses qu'on fait e Lovers Rock são destaques absolutos) e a alguns que não integrariam a lista numa edição típica.     Mesmo que a indústria ainda não tenha voltado a toda sua glória, o evento no sul da França pode ser um marco para a retomada de negociações no mercado audiovisual e também para o retorno ativo da filmografia de países que passaram os últimos meses sem novos lançamentos. A presença brasileira pode ser sentida na Seleção Oficial através do novo trabalho de Karim A