Piedra Noche (2021)

PIEDRA NOCHE

Direção: Iván Fund

Ano: 2021

Países de origem: Argentina / Chile / Espanha

    O cinema independente recente feito em nossos vizinhos sul-americanos possui muitas com a produção audiovisual brasileira, como a busca por realismo, ao mesmo tempo que tenta lidar com convenções de gênero. Dessa forma, encontra no fantástico um meio de abordar e superar traumas pessoais e sociais. Juliana Rojas e Marco Dutra fizeram justamente isso com o terror em seus últimos trabalhos, com grande destaque para Trabalhar Cansa (2011). E é esta a proposta do diretor Iván Fund em seu novo longa-metragem Piedra Noche, o qual integra mostra paralela do Festival de Veneza 2021.

    Após seu filho desaparecer à noite na praia, Greta (Mara Bestelli) e Bruno (Marcelo Subiotto) precisam conviver com o luto e decidem vender a casa de praia. Enquanto ela tenta colocar novamente a vida nos trilhos e superar a dor da perda, o olhar do marido está sempre perdido no meio do mar, como se quisesse manter a esperança de encontrar o garoto por trás das ondas. O filme não desenvolve o arco de nenhum dos dois de forma eficiente, o que acaba os tornando extremamente vagos, reduzidos apenas à dor. O roteiro ainda introduz Sina (Maricel Álvarez), uma amiga de Greta que vai ajudar o casal com a venda da casa, como um mecanismo para expor os sentimentos dos protagonistas, algo que deixa clara a falta de habilidade em trabalhar os personagens e que ainda torna esta última completamente descartável.

    Durante os créditos iniciais, a câmera percorre as areias da praia na qual quase todas as cenas do filme estarão situadas, enquanto a trilha sonora de Francisco Cerda dá um tom inesperado para a produção. Ele evoca as composições grandiosas de John Williams, cuja inspiração é evidente, para evocar um espírito de aventura que constantemente colide com a encenação de Fund. É justamente nesse choque de conceitos que o longa encontra seu maior problema. Enquanto a câmera de Gustavo Schiaffino está quase sempre na mão para ressaltar a busca pelo realismo, além de utilizar uma profundidade de campo reduzida para oprimir os personagens, a narrativa constantemente vagueia por elementos fantásticos: uma fusão que acaba não funcionando bem, provavelmente pela falta de controle da direção em relação ao tom construído.

     Outro grande problema presente aqui é a tentativa de fazer um comentário social sobre o impacto da plataforma construída na região costeira sobre o meio ambiente e a vida das trabalhadores da região. A temática é sentida de forma independente da história central e é mais um elemento descartável do longa, já que não há qualquer chance decente de explorar esse aspecto na narrativa. A plataforma e o pescadores são sempre vistos de longe, sem oportunidade alguma de desenvolvimento, o que nos faz pensar que foi um arco introduzido como o único objetivo de justificar a metáfora do monstro marinho.

    Parecem haver tantos elementos descartáveis, cenas inúteis e arcos desconexos que acaba soando como um projeto que funcionaria melhor com cortes de excesso, os quais tornam tudo paradoxalmente vazio. Talvez um curta-metragem seria a melhor opção nesse caso. No entanto, não podemos pensar no que o filme poderia ter sido, mas no que ele é. Infelizmente, não é a melhor versão do que poderia ter sido.

Texto publicado como parte da cobertura do Festival de Veneza 2021

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