Sin Señas Particulares (2020)



SIN SEÑAS PARTICULARES

Direção: Fernanda Valadez

Ano: 2020

País de origem: México / Espanha

    Texto escrito por Matheus Costa

    Há alguns anos, as discussões sobre imigração tornaram-se intensas devido aos ideais xenofóbicos promovidos pela extrema-direita em todo o mundo. Praticamente ninguém sai de seu país e deixa toda a sua história para trás porque gosta, arriscando muitas vezes a própria vida. Estas pessoas estão fugindo de realidades desoladoras ou procurando melhores oportunidades de emprego e moradia. Na África, tribos lutam entre si e deixam marcas de sangue pelo caminho. No Irã, o governo teocrático oprime todos que não se comportam segundo suas crenças. Na Palestina, uma guerra que parece interminável mata dia após dia. No México, gangues envolvidas no tráfico de drogas (que fornecem para países de primeiro mundo) transformam o país em um campo minado, massacrando a população.

    Por isso, a fronteira entre os Estados Unidos da América e o México é palco de tanto caos e de tantas tragédias. A xenofobia da população norte-americana é antiga e totalmente ilógica, considerando que o país foi fundado por imigrantes britânicos que fugiam da Igreja Anglicana. Esse pensamento ganhou ainda mais força com a ascensão do braço fascista da direita nos últimos anos, encontrando em Donald Trump seu símbolo máximo (e o miliciano Jair Bolsonaro no Brasil). A promessa de um muro separando "a maior democracia do mundo" do seu país vizinho ridiculamente rendeu uma quantidade imensa de votos nas eleições presidenciais de 2016.

    É nesse contexto que a diretora mexicana Fernanda Valadez dirige seu primeiro longa-metragem. Sin Señas Particulares, duplamente premiado no Festival de Sundance, centra sua história em Magdalena (Mercedes Hernández), uma mãe desesperada para encontrar seu filho desaparecido. Há dois meses, ele saiu com um amigo em direção à fronteira com a promessa de um emprego nos Estados Unidos. Sem notícias, a protagonista sai à sua procura, cruzando o país e encarando situações de puro terror.

    Através de uma montagem paralela muito bem executada, duas outras histórias cruzam o caminho de Magdalena. A primeira constitui um dos único problemas do filme, pois esta linha narrativa é abruptamente descartada no final do primeiro ato. Trata-se de uma mulher que precisa fazer o reconhecimento de um corpo que as autoridades alegam ser de seu filho, desaparecido há cinco anos. É uma sacada interessante do roteiro, pois é através daquela história que a protagonista vê um futuro sobre o qual não quer nem pensar. Tudo indica que o filho Jesús (Juan Jesús Varela) foi morto durante um assalto ao ônibus no qual se encontrava. Porém, como ela pode desistir da busca sem a certeza de seu destino? Ela precisa de respostas.

    A outra história que cruza com Magdalena é a de Miguel (David Illescas), um jovem recentemente deportado depois de viver anos de forma ilegal nos Estados Unidos. Ele está voltando para a casa de sua mãe, no interior do México, quando encontra a protagonista perdida pela localidade. Acontece que a mãe dele também está desaparecida. E ali estão eles: uma mãe sem o filho e um filho sem a mãe. Como lados opostos de uma moeda lançada ao ar pelas condições sociais do país, eles encontram no outro a força para continuar.

    Um aspecto técnico que precisa ser destacado é a direção de fotografia. Claudia Becerril Bulos concebe imagens que evocam diferentes tons ao longo do filme. Na cena de abertura, há um sensação etérea provocada pela utilização de névoa e de uma luz branca fria, enquanto vemos a única imagem de Jesús antes dele partir. Quando Magdalena ouve o terrível relato do que aconteceu durante o assalto ao ônibus, as imagens são enquadradas meio fora de foco e a cena é inundada na luz vermelha provocada (diegeticamente) pela fogueira que lá se encontra e que simboliza um tipo de força maligna. Em um toque de genialidade, um personagem que está sendo forçado a fazer algo muito ruim é enquadrado com o fogo ao fundo, mas com o vídeo sendo utilizado de forma reversa, criando um efeito que faz parecer que as chamas estão entrando em seu corpo, como se o "mal" estivesse lhe possuindo.

    Com uma estreia fantástica, Valadez firma seu nome como um para prestar bastante atenção nos próximos projetos. Ela foi capaz de construir um roteiro rico e cheio de personagens complexos, além de dar vida a eles através de sua direção sensível ao evocar os horrores enfrentados pelos mexicanos em sua fronteira, utilizando escolhas ousadas e imaginativas no terceiro ato. Além disso, Sin Señas Particulares ainda apresenta ao mundo a fantástica atriz Mercedes Hernández, em uma atuação firme e cheia de nuances.

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