Red, White and Blue (2020)

 



RED, WHITE AND BLUE

Direção: Steve McQueen

Ano: 2020

País de origem: Reino Unido

    Texto escrito por Matheus Costa

    Após os ótimos Mangrove e Lovers Rock, o diretor britânico Steve McQueen continua sua série antológica Small Axe, desbravando a vida e a cultura da comunidade negra que residia na Inglaterra durante a segunda metade do século XX, contexto no qual ele mesmo cresceu. Uma constatação interessante, pois explica todo o carinho demonstrado por aquelas pessoas e por aqueles lugares. 

    Este novo capítulo possui suas peculiaridades. A primeira parte da série era a retratação de um evento real e focava parte de sua narrativa em um drama de tribunal, posicionando os holofotes sobre a violência policial. Já na segunda, uma das melhores obras de 2020, a cultura é o enfoque, nos teletransportando para a magia de uma festa noturna nos subúrbios de Londres, onde a música é capaz de embalar os mais diferentes e poderosos sentimentos. Aqui há uma semelhança considerável com Mangrove, à medida em que também aborda a corrupção e o preconceito que emanam das forças policiais. A diferença está no fato de a trama focar não apenas na luta contra o sistema, mas em um indivíduo que tenta mudar a máquina social de dentro.

    Leroy (John Boyega) é um cientista com PHD cujo pai Kenneth Logan (Steve Toussaint) sempre o incentivou a construir uma carreira baseada em uma educação de qualidade. No entanto, ele quer sair dos laboratórios que o aprisionam e, assim, mostrar seus serviços diante da comunidade, exposto aos olhos das pessoas, como se procurasse a aprovação dos outros. É com isto em mente que ele tem a ideia de entrar para a polícia, embora fique inicialmente hesitante. Isto acontece por causa da repressão sofrida por sua comunidade, o que colocou as instituições públicas, principalmente a polícia, como um inimigo para eles.

    Mas um acontecimento parece levar Leroy a tomar uma decisão definitiva. O seu pai foi espancado por policiais, em uma cena de puro horror. A tensão relacionada ao encontro de Logan com oficiais já tinha sido estabelecida na primeira sequência do filme, quando o pequeno Leroy (Nathan Vidal) é abordado por policiais na saída de sua aula de música. Segunda eles, o garoto estava sendo enquadrado porque "batia com a descrição" de um fugitivo, algo que qualquer espectador com um mínimo de sensibilidade para o mundo no qual vivemos sabe que é apenas um pretexto para perpetuar terror em pessoas pretas. Logan sabe muito bem disso (ele cresceu naquela realidade) e já chega afastando os policiais de seu filho, para o qual ensina que, nesses casos, não pode haver passividade, pois é sem resistência que o preconceito vai continuar presente através das gerações.

    Retornando para a cena do espancamento, temos um controle muito inteligente da mise-en-scène por parte do diretor de fotografia Shabier Kirchner, que mantém os policiais chegando ao local apenas em um plano secundário da imagem, na qual Logan está comprando comida. Quando a aproximação entre eles acontece, a tensão é enorme, pois sabemos que o pai do protagonista não mede palavras com aqueles homens. A direção decide não mostrar a cena de forma gráfica, mantendo a câmera debaixo do caminhão de Logan. Nós só vemos o resultado daquela ação junto com Leroy, quando este chega ao hospital, fazendo com que sintamos o mesmo horror que ele está experimentando. É uma decisão criativa muito eficaz, pois faz com que o espectador compartilhe a motivação que leva a sua inscrição no processo de admissão.

    A partir deste ponto, acompanhamos seu treinamento e início de sua carreira como oficial. Ele tem a melhor das intenções: mudar o comportamento racista da instituição. Quer ser um herói para seus irmãos e irmãs, mas esta não é uma tarefa fácil. Não teria como ser, já que estamos falando de um sonho idealista e grandioso. Quando a realidade bate de frente com seus sonhos, a frustração é quase imediata. Como ter uma relação saudável no trabalho quando não há nenhum colega com o qual possa se identificar? Além disso, praticamente todos ainda permanecem a oprimi-lo, como se não fosse parte da equipe. Para completar, seus semelhantes passam a enxergá-lo como traidor, inclusive seu próprio pai, com o qual passa a manter uma relação complicada. 

    Acima de tudo, Red, White and Blue encontra sua força como um estudo sobre a frustração de uma minoria social que não consegue mudar o mundo que lhe oprime, motivo que o torna o mais intimista e universal entre os episódios iniciais da série. Tudo isso ancorado em duas ótimas performances. John Boyega está no melhor papel de sua carreira e consegue sustentar o filme também como um eficiente estudo de personagem. Já Toussaint constrói Logan com uma incrível sensibilidade, misturando afeto e raiva em sua relação com o protagonista. Ambos protagonizam uma cena final que, embora apressada como desfecho narrativo, consegue passar bem a ideia da frustração na luta social: as mudanças estão sempre acontecendo, mas geralmente (e infelizmente) de forma lenta.

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